A luta dos Estados nos últimos anos contra o avanço dos gastos com pessoal não tem sido suficiente para resolver o problema.
Levantamento
feito pelo serviço de notícias em tempo real do jornal O Estado de
S.Paulo, com dados do Tesouro Nacional, mostra que apenas sete Estados
estão em situação fiscal saudável em relação ao comprometimento das
receitas com o pagamento da folha. Os outros 20 estão com o sinal
amarelo em relação à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF): no limite de
alerta, no prudencial ou romperam o patamar estabelecido na legislação.
Os
dados são relativos ao segundo quadrimestre de 2019 e apenas ao Poder
Executivo. Pela LRF, o limite máximo de comprometimento das receitas
líquidas com a folha de funcionários do Executivo é de 49%. Antes disso,
no entanto, há dois níveis: o limite de alerta, quando a despesa
ultrapassa 44,1% da RCL, e o prudencial, ao atingir 46,5% das receitas.
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Desde
o auge da crise estadual, em 2015, muitos governadores cortaram
comissionados, enxugaram concursos e, em alguns casos, chegaram a
aumentar a alíquota de contribuição previdenciária dos servidores. Mesmo
assim, o item é a principal pedra no sapato das finanças estaduais. O
economista e especialista no assunto Raul Velloso destaca que muito foi
feito para enxugar o corpo de ativos, mas que o problema mora na conta
de aposentados e pensionistas, que não para de crescer.
"Tivemos
uma recessão feroz, que atingiu as receitas, e uma piora demográfica
que fez disparar as despesas. A conta não fecha. Em vários estados a
conta de ativos tem até caído em termos reais. O problema são os
inativos, uma conta que cresce sozinha e só muda sob efeito de reformas
que demoram tanto para ser aprovadas quanto para ter efeitos", diz.
Os
números mostram Rio Grande do Norte e Minas Gerais como os estados com
as finanças mais comprometidas com gasto com pessoal. No primeiro, essa
despesa representa 65,5% da receita corrente líquida (RCL). No segundo,
62,1%. O governo mineiro negocia, inclusive, com o Tesouro Nacional, o
ingresso no Regime de Recuperação Fiscal (RRF), desenvolvido para
estados em profundo desequilíbrio fiscal e que posterga o pagamento das
parcelas da dívida com a União e o BNDES em troca de um programa
estruturado de ajuste fiscal.
Em ambos os estados, a conta com
pessoal inativo responde por cerca de metade de todo o gasto bruto com
folha (dados de 12 meses encerrados em agosto). No Rio Grande do Norte,
47%. Em Minas Gerais, 49%.
O peso da Previdência
Estudo
feito por Velloso mostra que, em média, os governadores gastam 19,6% de
toda a sua receita corrente líquida com previdência. O número considera
a soma da contribuição patronal ao fundo de previdência própria (quando
existente) e o déficit da previdência estadual no ano. No entanto, em
estados com maiores dificuldades financeiras, como Rio Grande do Sul e
Minas Gerais, o comprometimento supera os 30%: no primeiro, chega a
37,5% e, no segundo, a 31,5%.
Quando se coloca na conta o passivo
atuarial (que considera quanto seria necessário hoje para arcar com
todas as obrigações futuras das previdências estaduais) para os próximos
70 anos, o estudo aponta que os gastos com previdência representam, em
média, 3,5 vezes a receita atual. No pior dos casos, no Rio Grande do
Norte, os custos futuros da previdência representam 5,21 vezes as
receitas atuais. Os números consideram dados de dezembro de 2017.
Por
isso, os estados aguardam a votação, no Congresso, da Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) que inclui os governos regionais na reforma
da Previdência, apelidada de PEC Paralela. Ao mesmo tempo, tentam passar
propostas próprias em suas assembleias.
A economista Ana Carla
Abrão Costa, ex-secretária de Fazenda de Goiás e que atualmente comanda a
consultoria Oliver Wyman, pontua que, hoje, boa parte das receitas dos
estados são consumidas pela folha de pessoal. E que já não há mais muita
margem de manobra para cortes em custeio e investimentos para abrir
espaço para novas despesas com folha. "Ao longo desses anos todos, desde
2015, os estados estão fazendo ajuste em cima de custeio e
investimento. Hoje, têm menos de 20% do Orçamento livre para gastos fora
de pessoal", diz.
Ela destaca que apenas uma reforma
administrativa estadual pode resolver o problema, reestruturando as
carreiras, de forma que o servidor demore mais tempo para atingir o topo
e torne a folha menos pesada. "Tem que haver uma reforma administrativa
que faça com que os gastos com pessoal parem de crescer ou reduzam.
Todo mundo chega no topo rapidamente, se aposenta com salário do topo da
carreira e continuam pesando na folha de forma indefinida. É um ciclo
de gasto que começa no concurso público e só termina quando o servidor
morre. E muitas vezes nem isso, porque temos pensões", aponta.
Para
ela, uma reforma administrativa teria que, essencialmente, englobar o
fim das promoções e progressões automáticas; instituir avaliação de
desempenho que permita remunerar pessoas de forma diferenciada conforme
mérito; e acabar com reserva de mercado nas leis de carreira, de forma
que um servidor possa prestar o mesmo serviço para diferentes órgãos, o
que hoje é caracterizado como desvio de função.
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